segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

O VINHO - por Alain Ducasse



Como todos os alimentos, sólidos ou líquidos, os vinhos, assim como os legumes, os queijos ou as aves, são a expressão direta de um terroir...

Por isso, estou convencido de que um vinho, para possuir e exprimir sua personalidade, deve ser necessariamente a mensagem de um solo que o viticultor irá depois colocar numa garrafa. Descodificar a natureza física e química de um solo, assim como a sua exposição à luz, é adivinhar as possibilidades que uma terra poderá colocar a serviço do vinhedo: um terreno pedregoso e bem drenado proveniente de aluviões, acumulados ao longo dos séculos, como o cascalho da região de Bordeaux, ou os resíduos de rocha da montanha de Reims. Saber que o calcário atua sobre a longevidade e o grau alcoólico, que a argila influencia a cor e os taninos, que o silício age sobre o aroma e o buquê, não significa suprimir o talento e a qualidade do trabalho humano, significa, antes de tudo, reconhecer a primazia do solo e da mensagem que ele quer exprimir...

Para mim, porém, os vinhos são muito mais do que prazer para as papilas e a tradução literal de um terroir: graças ao savoir-faire do homem, ao envelhecimento, às tradições, e a todos os símbolos ligados a eles, os vinhos são como indivíduos, e as garrafas hors d’âge são como lembranças vivas.

Atribuo ao vinho uma dimensão particular.

Considero a cozinha como uma sensação do imediato, do instantâneo – apesar de que ela deixa lembranças deliciosas -, mas o mundo do vinho é evidentemente o da duração. Eu diria quase, da longevidade. No fundo de um copo, existem às vezes dezenas de anos de paciência, de espera por um único instante: aquele em que vou bebê-lo. O vinho traz uma mensagem muito particular, de uma riqueza extraordinária, de todas as gerações que culminaram na sua elaboração.

O reino dos vinhos é tão vasto, tão rico, tão cheio de surpresas e de curiosidades que não me canso de provar, para continuar descobrindo, ainda e sempre, sabores inesperados...

A cada nova degustação, as experiências enriquecem minha palheta de sabores. “ Cada vinho trabalhado com inteligência, respeitando as qualidades e as mensagens do terroir , exprime uma identidade própria. Atrás de cada vinho se esconde sempre a personalidade de um indivíduo, sua história, seus gostos, seus sonhos. O vinho traça uma rota utópica que esperamos atravessar um dia.”...

Como sou cozinheiro e não sommelier, também me interesso pela combinação dos pratos com os vinhos. E como dizia Alain Chapel: “Descobrir um prato, pode ser também preparar uma surpresa sob a forma de um vinho inesperado”. De fato, quantas combinações possíveis e mágicas!...


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